quinta-feira, 19 de novembro de 2020

População em extrema pobreza no mundo aumentará pela 1ª vez em 22 anos, segundo relatório divulgado pela ONU


Foto: Pixabay

A pandemia de covid-19 e a crise econômica gerada pelo novo coronavírus farão com que mais 130 milhões de pessoas cruzem a linha da pobreza extrema em 2020 e 2021, o que resultaria no primeiro aumento, desde 1998, da porcentagem da população mundial que vive nestas condições, segundo um relatório das Nações Unidas divulgado nesta quinta-feira (19).

Se em 2018 a proporção da população mundial vivendo situação de extrema pobreza, com menos de US$ 1,90 (cerca de R$ 10) por dia, era de 8,6% (cerca de 650 milhões de pessoas), até o final ano deste pode alcançar 8,8%, de acordo com a projeção apresentada pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad).

O relatório, que prevê um impacto muito mais duradouro da crise econômica do que da sanitária, estima que quase 70 milhões de pessoas passarão a viver na pobreza extrema até o final de 2020, e que outras cerca de 60 milhões o farão em 2021.

Retração econômica é de 4,3%

A Unctad prevê uma retração de 4,3% do PIB mundial para 2020, projeção semelhante à do Fundo Monetário Internacional, que em outubro estimou uma queda de 4,4%, ambas inferiores à divulgada pelo Banco Mundial em junho (-5,2%).

“O vírus se beneficiou das interconexões e fragilidades derivadas da globalização, transformando uma crise sanitária em um choque econômico global que atingiu principalmente os mais vulneráveis”, explicou o secretário-geral da Unctad, Mukhisa Kituyi, durante a apresentação do relatório.

Em 2020, o estudo prevê que a pobreza extrema aumentaria especialmente na África Subsaariana, com um crescimento relativo de 2,74% com base na população que vive atualmente nestas condições (31 milhões de pessoas a mais).

O Sul da Ásia seria a segunda região mais afetada tanto em termos relativos, com um crescimento de 1,25% da pobreza extrema, quanto em números absolutos, com mais 23 milhões de pessoas nessa situação.

A Unctad também estima que, ainda em 2020, mais 3,58 milhões de pessoas cruzariam a linha da pobreza extrema na América Latina, enquanto no Oriente Médio e no Magrebe esse número superaria 4,91 milhões, no Leste Asiático e no Pacífico 4,41 milhões e na Europa e na Ásia Central 1,16 milhão.

Esses dados representam o primeiro retrocesso em três décadas: em 1990, a população mundial que vivia abaixo da linha da pobreza era de 35,9%, uma porcentagem que havia caído para um quarto atualmente.

Disparidade entre os mais afetados

O relatório fala de um efeito desproporcional tanto a nível regional, que afeta especialmente os países menos desenvolvidos, quanto no âmbito setorial, uma vez que atividades como as relacionadas ao turismo ou a pequenas e médias empresas foram muito mais impactadas pela pandemia do que outros setores da economia.

A análise da Unctad também indica que, embora idosos do sexo masculino tenham sido as principais vítimas do novo coronavírus, os mais prejudicados pela crise econômica foram os jovens e as mulheres, que também foram especialmente afetados pelo fechamento temporário de escolas em todo o mundo durante os meses em que muitos governos decretaram medidas de confinamento para conter a propagação da covid-19.

O estudo mostra ainda uma grande disparidade na resposta das diferentes economias à crise. Nos países desenvolvidos se investiu em média US$ 1.365 (cerca de R$ 7,2 mil) per capita em estímulos fiscais e outras medidas de recuperação econômica, valor que alcançou apenas US$ 76 (cerca de R$ 403) per capita nas nações em desenvolvimento.

Por isso, a Unctad pediu que haja um maior cooperação internacional para compensar essas disparidades, que se traduza, por exemplo, em alguma forma de alívio de dívidas externas e em mudanças na estrutura econômica global para que o caminho para a recuperação seja melhor e mais igualitário.

“A covid-19 causou dor e alterou o curso da história, mas pode ser um catalisador para uma mudança necessária”, destacou Kituyi, que julgou ser necessário “reformar as redes globais de produção e reiniciar a cooperação multilateral”, o que também poderia ajudar a promover uma distribuição mais justa das vacinas contra o vírus, quando elas sejam aprovadas para o uso em massa.

O secretário-geral da Unctad também acrescentou que a pandemia criou oportunidades para se avançar na transição para modos de produção menos prejudiciais ao meio ambiente.

Nesse sentido, o estudo estimou que as emissões de dióxido de carbono cairiam 8% este ano, devido à suspensão das atividades de alguns setores da economia, mas que é justamente o tipo de redução que precisa ser mantida a cada ano para garantindir o cumprimento da meta estipulada pelo Acordo de Paris para a mudança climática.

“Apesar das perspectivas sombrias, ainda é possível fazer com que a covid-19 marque um momento positivo para as Nações Unidas e que ajude a construir um futuro mais inclusivo, resiliente e sustentável”, concluiu Kituyi.

R7

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